Comentários as Novas Súmulas do Superior Tribunal de Justiça

Damásio de Jesus
Jurista; Doutor Honoris Causa em Direito pela Universidade de Estudos de Salerno (Itália); Conselheiro Editorial da Revista Magister de Direito Penal e Processual Penal.

Prescrição penal virtual, Súmula n. 438: "É inadmissível a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva com fundamento em pena hipotética, independentemente da existência ou sorte do processo penal".

Comentário: Nossos Tribunais Superiores sempre rechaçaram a tese da "prescrição virtual", "antecipada" ou "pela pena em perspectiva", derivação da prescrição retroativa. Os adeptos dessa corrente permissiva argumentavam que não se tratava de reconhecer a extinção da punibilidade antecipadamente, mas de aplicar a teoria das condições da ação penal, pois, na hipótese, faltaria ao Ministério Público interesse de agir em face da virtual impossibilidade de se obter um título condenatório válido. A suposta pena a ser aplicada na sentença, calculada antecipada e hipoteticamente, importaria o futuro reconhecimento da prescrição retroativa, baseada no revogado § 2º do art. 110 do Código Penal (CP).

A tese, com a qual nunca concordamos, já vinha perdendo espaço. A Procuradoria-Geral de Justiça de São Paulo, que já a acolhera no passado, estava afastando sua aplicação desde 2008. A Súmula n. 438 do STJ representou duro golpe na "prescrição virtual", mas, de certo, o definitivo sepultamento deu-se com o advento da Lei n. 12.234, de 5 de maio de 2010, que impediu o reconhecimento da prescrição retroativa no período anterior ao recebimento da denúncia. É verdade que essa modificação, por seu caráter gravoso (novatio legis in pejus), somente alcança fatos praticados depois de sua entrada em vigor, que ocorreu no dia 6 de maio de 2010. Para estes, notadamente, será juridicamente impossível invocar a tese refutada pela súmula.

Exame criminológico, Súmula n. 439: "Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada".

Comentário: Desde a alteração do art. 112 da Lei de Execução Penal pela Lei n. 10.792, de 2003, quando se deixou de exigir a realização de exame criminológico como requisito obrigatório para a progressão de regimes, iniciou-se discussão sobre a possibilidade de se determinar essa perícia, em casos excepcionais, objetivando conferir ao Juiz das execuções um subsídio importante para avaliar seu cabimento. Nossos Tribunais consolidaram o entendimento, agora consubstanciado na referida súmula do STJ, no sentido de que o exame deixou de ser obrigatório, mas não se tornou proibido, isto é, pode o Magistrado ordenar sua realização, desde que excepcional o caso e justificada a decisão. Essa orientação também pode ser adotada para condicionar a aplicação de outras medidas em sede de execução penal, como o livramento condicional (art. 83, par. ún., do CP), sempre de maneira excepcional e com motivação fundamentada.

Regime inicial mais gravoso do que o cabível, Súmula n. 440: "Fixada a pena-base no mínimo legal, é vedado o estabelecimento de regime prisional mais gravoso do que o cabível em razão da sanção imposta, com base apenas na gravidade abstrata do delito".
Comentário: A regra tem em vista os critérios de fixação do regime inicial de cumprimento de pena. De acordo com ela, não é lícito determiná-lo de maneira mais rigorosa do que a prevista no art. 33 do CP somente com base na gravidade abstrata do crime. Exemplo: conceder regime inicial fechado a réu condenado a pena mínima por roubo de pena aumentada pelo emprego de arma (art. 157, § 2.º, I, do CP), embora primário, de bons antecedentes e com outras circustâncias judiciais favoráveis, somente porque o fato típico, abstratamente considerado, mostra-se grave no entender do Juiz. Note-se que, pelos critérios legais, deve-se aplicar regime inicial semiaberto ao caso mencionado. O entendimento do STJ não constitui novidade, pois o Supremo Tribunal Federal (STF), já em 2003, elaborou súmula com enunciado semelhante: "A opinião do julgador sobre a gravidade em abstrato do crime não constitui motivação idônea para a imposição de regime mais severo do que o permitido segundo a pena aplicada" (Súmula n. 718).

Causa de aumento de pena do roubo não se aplica ao furto qualificado, Súmula n. 442: "É inadmissível aplicar, no furto qualificado pelo concurso de agentes, a majorante do roubo".

Comentário: No furto, o concurso de pessoas configura qualificadora, dobrando a pena (art. 155, § 4.º, IV); no roubo, é causa de aumento de pena, elevando-a de um terço até metade. Embora haja flagrante desproporção, pois a agravação é maior no delito de menor gravidade, o STJ afastou o entendimento de que os patamares de majoração do roubo (um terço até a metade) devem ser aplicados ao furto cometido mediante o concurso de duas ou mais pessoas. Nota: as expressões "concurso de agentes" e "majorante" não são usuais na legislação nem na doutrina penal.

Fixação da pena do roubo e concurso de causas de aumento, Súmula n. 443: "O aumento na terceira fase de aplicação da pena no crime de roubo circunstanciado exige fundamentação concreta, não sendo suficiente para a sua exasperação a mera indicação do número de majorantes".

Comentário: A pena do roubo, de acordo com o art. 157, § 2.º, do CP, é aumentada de um terço até a metade quando presente alguma das circunstâncias indicadas no dispositivo, como o emprego de arma, o concurso de duas ou mais pessoas etc. Discutia-se a respeito de a pluralidade de circunstâncias acarretar a aplicação de um aumento obrigatoriamente superior ao mínimo legal (um terço). O extinto Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo (TACrimSP) havia decidido que, havendo duas circunstâncias, "o aumento deve ficar entre o mínimo e o máximo estipulado, ou seja, em 2/53 (5.ª Câm. Crim., ACrim n. 206.555, rel. o então Juiz Denser de Sá, RT 734/673). De ver-se, contudo, que o STF jamais viu com bons olhos a utilização de "tabela" para efeito de cálculo de pena no concurso de causas de aumento (2.ª T., HC n. 73.070, rel. Min. Carlos Velloso, vencido, DJU de 29.9.2000, p. 1787). De acordo com o STJ, "em se tratando de roubo qualificado por mais de uma circunstância, para a fixação do aumento da pena acima do mínimo legal, em sua jurisprudência recente, faz-se necessária a demonstração da imprescindibilidade de sua imposição, que não decorre abstratamente do número daquelas qualificadoras" (REsp n. 457.338, DJU de 1.º.3. 2004, p. 204). É justamente esse o entendimento consubstanciado na súmula acima referida.

Pena-base e processos e inquéritos policiais em curso, Súmula n. 444: "É vedada a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a pena-base".
Comentário: A súmula baseia-se no princípio constitucional do estado ou presunção de inocência, segundo o qual somente uma condenação transitada em julgado, incapaz de gerar reincidência, pode servir, como fundamento para o reconhecimento, na primeira fase da dosimetria da pena, de circunstância judicial desfavorável (art. 59, caput, do CP). Essa orientação vem sendo aplicada pelo STF há muitos anos.

Informações bibliográficas:
JESUS, Damásio de . Novas Súmulas do Superior Tribunal de Justiça. Editora Magister - Porto Alegre - RS. Publicado em: 11 ago. 2010.

Disponível em: http://www.editoramagister.com/doutrina_ler.php?id=797

fonte: www.editoramagister.com

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